- É na casa do pó/torre de babel/factory lda./prospect cottage/rua da constituição, 91 que nos conhecemos e é dentro do regresso que nos encontramos. Falas me do tempo e lembro me da lua quando cheia e outros objetos passageiros - escolho-os como quem os esquece. Lembro-me da sobra que é escrita e da escrita que é continua, do sentimento de não me lembrar de todas as conversas que tive e nele encontrar paz ou a ausência de guerra.

- Outra vez, a rua virada deserto puxou a conversa que puxou o ritmo que puxou a conversa. Linguagem e velocidade, as massas que durante uma ou mais semanas nos pareceram novas. São elas que formam cada uma das linhas ou superfícies concêntricas de um fluido quando agitado num dos seus pontos. São elas os consumos que nos consomem. São elas que formam esse teatro da memória [que] passa a ser uma máquina de transformar o representado em representante, o suporte em assunto, o documento em monumento. As paredes que convergem no corpo de cada um, as vezes agressivas como as luzes outras estáticas como a caixa onde vive a serpente. Foi la em CIMA mais corpo menos dia, corpo esse que espera pelos que o explodem, que se alastra. É fácil sentir falta do que nunca nos foi oferecido.

- Foi sempre a linguagem que uniu o que fora decomposto, as linhas filiformes e as cadeiras sem ninguém para se sentar. A casa onde vivia, ora abandonada ora muito cuidada, dependia das emergências do tempo como unidade. Se olharmos, de facto, atentamente para uma casa, para a sua constituição, poderemos quase ver o corpo para o qual foi construída. Como se em vez de estarmos a olhar para uma casa estivéssemos a olhar para um mapa da anatomia humana. A casa é o retrato das nossas dependências físicas. O corpo político e o corpo que é político. Ou do corpo como ponto de partida para uma geopolítica de responsabilização. Começar assim, não por um continente, por um país ou por uma casa mas pela geografia mais próxima - o corpo. Aqui pelo menos, sei que existo.

- Só uma vez foste la jantar e o quarto, que era espaço comprado que era trabalho, congelou para dar espaço ao ar. Era de noite, perguntei te alguma coisa que não me lembro. Pensaste muito, enquanto murmuravas uma melodia baixinho e finalmente escreveste. Olhei o caderno:

SE NÃO É PARA ARDER ENTÃO QUE A FACA CORTE O FOGO

- Esperamos o futuro. Maravilhados, o comandante e os da rua murmuram a canção da madrugada “A deus que nos cortou o gato em dois, ébrio como o tempo fez-nos ver a corrida dos sois…” Abdicar é andar a pé até ficar descalço, qual Verbo qual percurso aéreo se podemos propor um jantar para logo? E a própria a que se dirigem os poemas, baseia dita desculpa numa ida repentina à Europa central…

- Jantar cancelado, andamos pelas ruas de Lisboa porque o quarto estava fora de questão. E se de repente a conversa fica sem mesa sobre a qual se toldar, se de repente te fosses embora, quais corpos restariam por fundir? Ser por ser; somos só o que fizemos ontem.

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